O CONTEXTO RELIGIOSO DO
NOVO TESTAMENTO
O século I da era cristã foi um século
de tremendas mudanças e de profundas transformações da Palestina.
No inicio do século I
A dinastia herodiana gozava de certas
prerrogativas. O templo aglutinava a vida religiosa do país. A sociedade
judaica encontrava-se fracionada em inúmeras seitas e grupos.
No fim do século I
A realeza tinha desaparecido da Judéia,
o país estava incorporado ao sistema provincial romano. O templo estava em
ruínas, cessaram o culto sacrifical e as peregrinações festivas. O rabinismo
apresentava-se como a única instituição florescente.
Neste século de mudanças, surgirá a
primeira comunidade cristã, e nela, aparecerá boa parte dos escritos que
constituirão o fundamento do cristianismo posterior. Porém, O NT não pode
compreender-se só com o contexto palestino. A pregação cristã sai logo dos
limites judaicos para enfrentar e ganhar aos poucos o mundo pagão. Assim, pois,
para compreender o NT e situá-lo no quadro concreto é necessário apresentar
tanto o contexto judaico quanto o contexto pagão.
I- O
CONTEXTO JUDAICO
1- O
judaísmo palestino antes da destruição do templo
c-
Práticas religiosas
O
templo constituía o centro de toda prática religiosa nesta época, com seus
sacrifícios, suas festas e peregrinações anuais. A maior parte do ritual do
templo se celebrava no pátio dos sacerdotes, onde se achava o altar dos
sacrifícios, o degoladouro e o mar de bronze. No interior, no santo,
encontrava-se o altar dos perfumes, a mesa dos pães da proposição e o
candelabro de sete braços. Separado do santo por uma cortina, achava-se o
santo dos santos, o mais sagrado recinto. Estava vazio, e só o sumo
sacerdote tinha acesso a ele, uma vez por ano na festa da expiação. 24 turnos
de sacerdotes asseguravam sucessivamente o serviço do templo. O país era
dividido em 24 circunscrições, que enviavam ao templo levitas e israelitas para
assistirem aos sacerdotes do turno, em certos aspectos do culto.
Os sacerdotes realizavam os sacrifícios, queimavam o incenso,
ascendia o candelabro e abençoavam o povo. Os levitas ocupavam-se do
canto e da guarda do recinto do templo. O povo dirigia-se ao templo não
só durante as festas de peregrinação, mas frequentemente para cumprir diversos
preceitos com a oferenda das primícias, para participar da liturgia e oferecer
sacrifícios obrigatórios ou voluntários e para purificar-se de impurezas graves
com água benta da novilha vermelha.
O culto
diário consistia fundamentalmente nos dois sacrifícios perpétuos, matutino e
vespertino, de um cordeiro de um ano sem defeito. Ao nascer o sol, começava o culto com a
abertura das portas do santuário, a retirada das cinzas do altar dos perfumes e
a reativação do candelabro. Seguia-se a degola do cordeiro do sacrifício e a
disposição e salgamento de suas partes sobre o altar, assim como a preparação
dos pães de farinha e o azeite da oferenda diária e da oferenda do sumo
sacerdote. Continuando, os sacerdotes recitavam os mandamentos e o “escuta
Israel”, enquanto que aquele que era designado por sorteio oferecia o incenso
dentro do santuário, ato seguido da bênção sacerdotal ao povo (Lc 1,8-10).
Depois completava-se o sacrifício com a queima dos membros da vítima e das oferendas e com as libações do vinho
sobre o altar, e tudo terminava com o cântico dos levitas. O sacrifício
vespertino transcorria de maneira parecida.
As
festas mais importantes do ano eram a Páscoa, Pentecostes e a festa dos
Tabernáculos. A Páscoa era celebrada
na primavera para recordar a libertação do Egito. O elemento mais
característico era o sacrifício do cordeiro pascal, no dia 14 de Nisan, véspera
da Páscoa. Oito dias após (segundo os saduceus) ou no segundo dia da Páscoa
(segundo os fariseus), recolhiam-se e se ofereciam os primeiros feixes (festa
de Omer), o que permitia consumir já
as novas colheitas. Cinqüenta dias depois da Páscoa celebrava-se a festa de Pentecostes ou das Semanas. No
principio era uma festa de ação de graças pela colheita, festa das primícias,
cujo rito característico era a oferenda dos pães de trigo; porém, em nossa
época, havia-se associado a ela a celebração do dom da Lei e da aliança
sinaítica. A festa durava um só dia; porém durante os seis dias seguintes, era
permitido oferecer os sacrifícios obrigatórios e levar as primícias dos frutos
ao templo. A festa mais agradável era a dos Tabernáculos ou das Cabanas, visto
que o povo morava, durante essa festa, em cabanas feitas com ramagens de
árvores. É designada pela tradição judaica como a “festa” por excelência.
Durava sete dias, os sacrifícios no templo eram mais numerosos, cantava-se o Hallel (Sal 113-118) com acompanhamento
de flautas e batiam palmas em sinal de
regozijo em volta do altar. Talvez o elemento mais característico da festa
nesta época fosse a cerimônia de libação da água sobre o altar. Os pátios do
templo eram iluminados e o povo dançava durante toda a noite até chegar o
alvorecer, quando se descia a piscina de Siloé para recolher a água da libação
que seria oferecida sobre o altar. Cada sete anos, no final da festa, lia-se
publicamente a Torá.
Era também importante a festa da Expiação, chamada festa do
jejum (At 27,9), Yom Kippur ou
simplesmente “o dia”. Era dedicado a expiação dos pecados. Nesse dia o sumo
sacerdote era o único oficiante no templo, tanto dos sacrifícios perpétuos como
das oferendas e sacrifícios especiais da festa.
Outros sacerdote realizavam ritos que se deviam fazer fora da cidade, o
mais importante dos quais era o envio do bode expiatório ao deserto, carregado
dos pecados do povo. O elemento mais característico era a entrada do sumo
sacerdote, vestido de roupas brancas, no santo dos santos para oferecer o
incenso e aspergir o recinto com sangue, rito que tinha o mesmo valor do
sacrifício do bezerro, ou do cabrito macho.
A
festa de Hanukká (ou dedicação, cf. Jo 10,22) tinha sido instituída para celebrar a
purificação do templo feita por Judas Macabeu depois da profanação de Antíoco
IV Epífanes (1Mc. 4,59; 2Mc 1,18). Celebrava-se durante oito dias, a partir do
dia 25 do mês de Casleu, com sacrifícios e procissões, e o rito característico
era a iluminação do templo, das sinagogas e das casas particulares, por isso
chamada também como “festa das luzes”.
A
festa dos Purim (das sortes) celebrava-se em meados do mês de Adar para comemorar a
libertação dos judeus persas, narrada no livro de Ester (Est 9,27). Segundo a
tradição rabínica os elementos característicos seriam a leitura sinagogal do
livro de Ester, as obras caritativas e os banquetes, precedidos de um dia de
jejum;na prática a festa adquiriu rapidamente as características de um
carnaval,que se conserva até nossos dias.
A
celebração do sábado nesta época tinha alcançado contornos muito precisos. O ritmo dos
sacrifícios do templo era diferente nesse dia:não se ofereciam sacrifícios
individuais, senão unicamente os da coletividade, com um sacrifício adicional
dos cordeiros. Colocavam-se os 12 pães da proposição dentro do santuário e
distribuíam-se entre os sacerdotes, sendo consumidos os 12 pães da semana
anterior. Havia-se acentuado, sobretudo, o aspecto do repouso com a proibição
de realizar certas atividades. No judaísmo rabínico estas prescrições se
desenvolveram e se modificaram sistematicamente, e no tratado Shabbat da Mishná
enumeram-se 39 “trabalhos” proibidos durante o sábado (Jo 5,10; Lc 13,14; Mt
12,2). Porém, junto com o elemento repouso, a celebração do sábado valorizava o
aspecto de “dia consagrado a Yahvé” dia dedicado à oração, à leitura religiosa
e ao serviço sinagogal.
As
três peregrinações anuais ao templo de Jerusalém nas festas de Páscoa,
Pentecostes e Tabernáculos (Êx 23,27 e Dt 16,16) eram alguns dos elementos
fundamentais da prática religiosa da época e serviam para estreitar os laços
entre os habitantes de Jerusalém e o resto da comunidade judaica da Palestina
como da diáspora. Os peregrinos estavam obrigados a oferecer determinados
sacrifícios e oferendas, e a tradição posterior exige a obrigação da esmola.
Outro elemento desenvolvido nessa época
era o estudo da Torá no templo, durante as peregrinações (Lc 2,46; Jo 7,14).
Como nos mostram os textos do NT, os
elementos de crença e d práticas religiosas do judaismo palestino eram em
grande parte comuns a todos os grupos judaicos e também ao grupo dos primeiros
cristãos. Nada há,pois de estranho que neste contexto pluralista o cristianismo
nascente fosse considerado no começo como uma “seita” judaica a mais. Para os
adversários judeus do cristianismo nascente, esta é uma hairesis judaica a mais (At 24,5; 5,24-39). Gamaliel não duvida
recomendar que se mantenha com relação aos cristãos uma atitude de
prudência. Tal atitude contrasta
fortemente com a que adotará pouco mais tarde R. Gamaliel II, ao impor a
maldição contra os nosrim e os minim (os cristãos e os hereges ou
judeu-cristãos) na duodécima bênção da Amida,
atitude que implica a separação entre cristianismo e judaísmo. Porém já então,
no final do século I, o judaísmo palestino estava profundamente transformado.
FIQUEM NA PAZ DE DEUS!
SEMINARISTA SEVERINO DA SILVA.
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