O
sangue da aliança
AS
BASES DE UMA NOVA SOCIEDADE
Um
povo em aliança com Deus
(Ex
19,1-6; 24,3-11)
Depois da passagem do Mar Vermelho começa a grande caminhada para a Terra prometida. Depois de 50 dias, os israelitas chegam ao sopé de uma montanha, o Sinai. Neste lugar grandioso, Deus vai fazer Aliança com este povo (Ex 19,1-6), por meio de Moisés. Deus propõe ao povo livre uma aliança, e o povo aceita livremente. Desse modo, Israel torna-se propriedade especial de Deus. A única autoridade sobre o povo é o próprio Deus. Esta é a vocação do povo de Israel. A palavra Aliança tem um conceito profundo: em hebraico, BERIT, e em latim, TESTAMENTUM, o que se pode traduzir por pacto, vínculo, comunhão, união, diálogo, casamento, tratado, compromisso... É garantia de bênção para quem a observa e de maldição aos transgressores. Por esta razão, o evento sinaítico deve perpetuar-se na sua repetição cultual, isto é, o povo de Deus escolhido sempre tem de ter ante os olhos de sua fé a Aliança feita por Deus. Como diz Ex 24,3-11: O rito da aliança mostra o acordo entre os contraentes: Deus, representado pelo altar, e o povo se comunicam através do mesmo sangue, que é o símbolo da vida. O que, por sua vez, o Novo Testamento apresentará a Nova Aliança selada com o sangue de Jesus (Mt 26,28).
O paralelo com Jeremias se dá com o ápice espiritual do Livro
(31,23-40), onde o profeta fala da “Aliança Nova” que Deus vai estabelecer
e que não substitui, mas renova as precedentes. Mais uma vez, nessa Aliança
Deus compromete a si mesmo e requer o compromisso da outra parte, porque se
percebe que a aliança antiga se caracterizava por uma lei externa e por
mediações entre Deus e o povo. Contudo, nesta aliança nova prevalecerá uma
relação com Deus em que todos terão o senso do amor e da fidelidade, de tal
maneira que não serão mais necessárias nem lei externa nem mediações. O que
Jeremias vê aqui é a realização plena do projeto de Deus: a humanidade nova, em
que as estruturas de poder são superadas pela fraternidade, e as estruturas
econômicas pela partilha justa dos bens que Deus concede a todos.
O paralelo com Ezequiel exprime a realidade
do Novo Israel, através da Aliança
(berît), descrita nos capítulo
16 e 36. Neste, Ezequiel faz um retrato
simbólico da história de Jerusalém, descrevendo a origem e apogeu da cidade: de
humildes origens pagãs, Jerusalém se tornou, no tempo de Davi, a capital de
todo o reino de Israel. Desse modo, Jerusalém é o símbolo concreto da aliança
amorosa entre Deus e seu povo. Foi a Aliança
do Sinai que selou a escolha de Israel como povo de Deus e será uma Nova
Aliança a relação que Javé Deus terá com seu povo renovado (Ez 16,59-63): aqui
Javé Deus mostra que sua fidelidade à aliança é mais forte do que as
infidelidades do seu povo. O seu perdão faz o povo reconhecer a própria
infidelidade, para se converter e voltar à Aliança.
Quando no Novo Testamento Jesus fala “Este é o meu corpo, este é o meu sangue”, não se trata de uma simples renovação da Aliança no Antigo
Testamento. Trata-se, sim, do Pacto sagrado selado de uma vez por todas entre o
Deus-amor com seu novo povo, que é chamado à fidelidade do anúncio (querigma)
salvífico, o qual resgata toda a história do Israel antigo. Estas palavras que Jesus falou durante a Última Ceia
repetem-se cada vez que se renova o Sacrifício eucarístico. Conduzem-nos ao
Cenáculo e trazem o caráter espiritual daquela noite, quando, celebrando a
Páscoa com os seus, o Senhor antecipou no mistério o sacrifício que seria
consumado no dia seguinte sobre a cruz. A instituição da Eucaristia surge como
antecipação e aceitação de Jesus pela sua morte. Escreve a esse propósito Santo
Efrem, o sírio: durante a ceia, Jesus sacrificou-se, na cruz Ele foi morto por
outros.
“Este é o meu sangue”. Clara é aqui a referência à linguagem sacrificial
de Israel. Jesus se apresenta como o verdadeiro e definitivo sacrifício, no
qual se realiza a expiação dos pecados, o que, nos ritos do Antigo Testamento,
não fora ainda plenamente realizado. A essa expressão se seguirão outras duas
muito significativas. Em primeiro lugar, Jesus Cristo disse que seu sangue era
“derramado em favor de muitos”, com uma compreensível referência aos cantos do
Servo, encontrados no livro de Isaías (cf. capítulo 53). Com o acréscimo de “o
sangue da aliança”, Jesus deixa claro que, graças a sua morte, finalmente se
torna efetiva a aliança feita por Deus com “seu” povo. A antiga aliança fora
estabelecida no Monte Sinai com o rito sacrificial de animais (cf. Ex 12,42-49) e o povo eleito, libertado da escravidão no Egito, havia prometido
seguir as orientações do Senhor (cf. Ex. 24,3).
Israel, com a construção do bezerro de ouro, na verdade, mostrou-se
incapaz de se manter fiel à Aliança divina, que foi transgredida frequentemente.
Mas o Senhor não abdicou de sua promessa e, através dos profetas, chamou a
atenção para a dimensão interior da Aliança, e anunciou que gravaria esta nova
lei nos corações dos fiéis (cf. Jr 31,33), transformando-os com o dom do
Espírito (cf. Ez 36,25-27).
Por sua vez, durante a Última Ceia Jesus fez com os discípulos a Nova
Aliança, não a confirmando com sacrifícios de animais, como no passado, mas com
o seu sangue, tornado “sangue da nova aliança”. Isto é evidenciado na Carta aos
Hebreus, onde o autor sagrado declara que Jesus é o “mediador de uma nova
aliança” (9,15). Tornou-se isto graças ao seu sangue ou, mais precisamente,
graças ao dom de si, dando pleno valor ao seu sangue. Na Cruz, Jesus é, ao
mesmo tempo vítima e sacerdote. vítima digna de Deus porque sem mancha, e sumo
sacerdote que oferece a si mesmo, sob o impulso do Espírito Santo, e intercede
por toda a humanidade.
Por fim, a Cruz é, portanto, mistério de amor e de salvação, que
purifica a consciência da “opere morte”, isto é, do pecado, e santifica-nos,
esculpindo a nova aliança em nossos corações; a Eucaristia, renovando o
sacrifício da Cruz, nos faz capazes de viver fielmente a comunhão com Deus. Para os judeus, sangue e
sacrifício estão ligados com perdão e aliança (cf. Ex 24). A Nova Aliança foi
estabelecida pela morte e ressurreição de Cristo e mostra que Jesus, com sua
morte, deixou-nos a nova aliança como testamento. Jesus Cristo é ao mesmo tempo
redentor e mediador: nele encontramos o perdão e nele nos relacionamos com
Deus. Por isso, O NT destaca de forma maravilhada esse Pão da Vida, que Jesus
Cristo nos oferta e o qual é Ele mesmo: cf. Mt 26,17-29; Mc 14,12-25; Lc
22,14-20; Jo 6,35-71; 1Cor 11,23-26; Hb 9,15-28).
BIBLIOGRAFIA:
Bíblia de Jerusalém – São Paulo – Editora: Paulus,
2002.
Bíblia do Peregrino – São Paulo: Editora Paulus – 2ª
ediação – 2002.
Bíblia Sagrada – Edição Pastoral, São Paulo –
Editora: Paulus, 1990.
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