Certamente todo cristão que possui uma “prática de fé” acredita que Jesus realmente existiu e dados históricos como os que estão presentes nos Evangelhos comprovam isto. Para os cristãos Jesus foi um homem simples, sem deixar de ser Deus na sua essência (homem e Deus, possuidor de duas naturezas, em uma só pessoa). Vemos nos Evangelhos sinóticos que Ele nasceu de uma jovem chamada Maria, na cidade de Belém e teve um pai “adotivo” chamado José. Precisamente Lucas no seu Evangelho afirma que Jesus foi gerado no ventre de sua mãe por intermédio do Espírito Santo. Portanto a virgem o concebeu sem conhecer homem algum.
Bento XVI afirma: “quis tentar representar o Jesus dos Evangelhos como Jesus real, como o ‘Jesus histórico’ no sentido autêntico [...] penso que precisamente este Jesus – o dos Evangelhos – é uma figura racional e manifestamente histórica”.
Vemos o início do ministério de Jesus com o seu batismo no rio Jordão por João Batista. A partir desse fato, Ele começa a revelar sua ação transformadora na luta por um mundo melhor que começara já bem antes de forma oculta na encarnação. Na perícope que mostra as tentações de Jesus indica que Ele cheio do Espírito Santo foi levado ao deserto. Lá venceu as tentações do demônio por quarenta dias. Voltando a Galiléia e precisamente em Nazaré leu a passagem do livro de Isaías que diz: “O Espírito do Senhor está sobre mim, porque o Senhor me ungiu” (Lc 4, 18; Is 61, 1).
Ora, depois da tentação de Jesus no deserto os três Evangelhos sinóticos estão em comum acordo revelando que Jesus começou a exercer o seu ministério na Galiléia, podemos constatar em Lc 4, 14; Mc 1, 14 e Mt 4, 23. “Começou a percorrer toda a Galiléia [...] proclamando o Evangelho do Reino de Deus e curando entre o povo todas as doenças e enfermidades”.
A sua origem de Nazaré, da Galiléia – é, na realidade, a prova da sua missão divina. Jesus proferiu o Sermão da Montanha justamente num monte da Galiléia para uma multidão. O evangelista não cita o nome, por isso, podemos dizer que este monte é o “novo Sinai” enquanto Jesus é o “Novo Moisés”. O monte é o lugar da oração de Jesus, também é o lugar do seu ensinamento, porque brota do mais íntimo da sua relação com o Pai. Em Jesus, Deus se torna revelado e vemos que Ele não é um distante desconhecido, N’ele Deus mostra seu rosto, Sua vontade e Seu agir. Logo, conhecemos os pensamentos e as vontades de Deus em Jesus.
Ora, antes de escolher os doze discípulos aqueles que darão continuidade ao seu projeto (os Apóstolos) Jesus passa a noite em oração e precisamente num monte (Lc 6, 12). Ele sobe ao monte, que designa o lugar da sua comunhão com Deus – o lugar elevado, acima da ação e do fazer de todos os dias. A vocação dos discípulos é um acontecimento da oração; eles são gerados na oração, na intimidade com o Pai.
Enviados a missão os Apóstolos se tornaram homens da Palavra de Deus, anunciaram o Reino de Deus pregaram em nome de Jesus Cristo, reuniram assim homens formando uma nova família de Deus. Mas esta palavra profeticamente anunciada não é simples palavra e instrução. Ela, sobretudo é acontecimento, tal como Jesus mesmo é acontecimento, palavra de Deus em pessoa. No entanto, no convívio com os Apóstolos o Mestre também lhes falava em forma de Parábolas. As parábolas formam, sem dúvida, o núcleo essencial da pregação de Jesus.
Ora, “em verdade, em verdade vos digo: se o grão de trigo não cair na terra e não morrer, permanece sozinho; mas, se morre, dá muito fruto” (Jo 12, 24). Nas parábolas, Jesus não é apenas o semeador, que espalha a semente da palavra de Deus, mas também é a semente, que cai na terra para morrer e assim produzir muitos frutos. Na realidade Ele quer nos conduzir para o “mistério de Deus”, para a luz que os nossos olhos não suportam e da qual fugimos, ou seja, aceitar o sentido das parábolas é ter a certeza de adquirir conhecimento que se identifica com a vida, conhecimento que não podemos entender sem “conversão”.
Como vimos acima, a constatação de “Jesus histórico” através dos Evangelhos sinóticos nos revela que o mistério de sua unidade com o Pai está sempre presente e tudo determina, mas Ele permanece, no entanto escondido sob a sua humanidade, porém no evangelho de São João no qual não ouvimos parábolas a divindade de Jesus aparece claramente, vejamos: “ninguém jamais viu a Deus. O único, que é Deus e que repousa no coração do Pai é que O deu a conhecer” (Jo 1, 18).
Mediante isto, fica claro que, no Evangelho Joanino Jesus é o Filho que repousa no coração do Pai, possui por excelência comunhão com Ele – conhecendo assim todo seu mistério. No entanto, assim como Jesus o evangelista São João, também foi capaz de adquirir tamanho conhecimento acerca do Mestre porque se reclinou sobre o seu peito (Jo 13, 25), pondo-se a escutar o seu coração. Segundo o exegeta católico Ingo Broer: “o evangelho de João está assim diante de nossos olhos como uma obra ‘literária’ que dá testemunho da fé e que quer fortalecer a fé, e não como um relato histórico” (p. 197).
Diferentemente não encontramos no Evangelho de João dois fatos importantes acerca da vida de Jesus Cristo, a confissão de Pedro e a transfiguração. Acerca da confissão de Pedro nos três sinóticos ele responde em nome dos doze discípulos: “Tu és Cristo, Filho do Deus vivo!” (Mt 16, 16). Podemos ver aqui já uma clara e evidente primazia de Pedro diante do grupo escolhido por Jesus (Mt 16, 13-20; Mc 8, 27-30; Lc 9, 18-21). Porém na transfiguração de Jesus e precisamente nos três sinóticos explica e aprofunda esta confissão de Pedro e ao mesmo tempo faz sua ligação com a morte e ressurreição de Jesus (Mt 17, 1-13; Mc 9, 2-13; Lc 9, 28-36).
Nos dias atuais a pessoa de Jesus Cristo ainda continua sendo estudada por muitos cientistas como teólogos, sociólogos, psicólogos, filósofos, mas já no seu tempo procuraram algumas pessoas interpretar a Sua figura misteriosa. Ele era visto como profeta, como Elias ou Jeremias ressuscitados ou como João Batista (Mc 8, 28). No entanto, como vimos no parágrafo acima São Pedro é quem emprega títulos mais elevados: Cristo e Filho de Deus.
Certamente a pessoa de Jesus e o mistério que o envolve continuam ainda hoje a aguçar a curiosidade de muitos estudiosos. A expressão Filho do homem é o título que Jesus usou com mais freqüência ao falar de si mesmo: “Eis que eu vejo o céu aberto e o Filho do homem de pé à direita de Deus” (At 7, 56). A expressão Filho do homem significa, no uso lingüístico, tanto em hebraico como em aramaico, muito simplesmente “homem”. Jesus usou este termo porque de certa maneira está este título intrínseco na sua vida e na sua ação no meio da humanidade.
Por fim, Deus escolheu fazer parte de um povo simples, humilde e sofredor. Quis nascer numa família pobre, onde seu pai adotivo foi um carpinteiro e sua mãe uma simples judia, desta maneira Deus Pai revelou sua face ao mundo na pessoa do Verbo encarnado Seu Filho Jesus Cristo, trazendo, portanto a salvação para todo aquele que aceitar o seu projeto e conseqüentemente quem n’Ele crer.
REFERÊNCIA:
Joseph Ratzinger – Bento XVI – Jesus de Nazaré – Primeira Parte: Do Batismo no Jordão à Transfiguração – tradução: José Jacinto Ferreira de Farias, SCJ – 3ª Edição – São Paulo – Editora Planeta do Brasil – 2007.
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